Criminalística carece de profissionais e enfrenta sucateamento de laboratórios: inquéritos acabam inconclusos.
A falta generalizada de laboratórios, equipamentos e funcionários no Instituto de Criminalística de Sergipe têm resultado em investigações policiais sem provas, baseadas apenas em confissões testemunhais que nem sempre garantem a elucidação de crimes. O resultado: impunidade. “Os criminosos estão soltos por falta de prova. As perícias chegam a ser realizadas, mas são concluídas sem evidências técnicas. Os peritos dispõem de pranchetas, tomando dados no local do delito ou do crime, e finalizam o laudo na base do ‘eu acho’, do olhômetro. Qual a validade disso?”, denunciou Armando Nascimento, ex-presidente da Associação de Peritos Criminais, entidade hoje sem autuação no Estado. Armando já se aposentou das atividades desenvolvidas no órgão, mas ainda assim revelou com precisão o que os colegas da ativa omitem por medo de influências políticas em seus cargos.
Em Sergipe há apenas 16 peritos para dar conta de uma população superior a dois milhões de habitantes, quando o efetivo mínimo necessário seria de 400 profissionais. Para aqueles crimes que dependem de um laudo de DNA para elucidação a situação é ainda mais grave: o diagnóstico só é feito uma vez por ano na Bahia, onde um acúmulo de 41 exames remetidos pelo Estado sergipano carece de resultado desde 2007.
“Falta tudo ou quase tudo”, alertou o presidente do Sindicato dos Policiais Civis de Sergipe (Sinpol), Antonio Moraes, sobre a carência do órgão. A situação pode ser constatada por qualquer pessoa sem mesmo entrar no prédio do instituto, pois a própria fachada denuncia o quanto a unidade está desgastada pela falta de investimentos. Até mesmo o letreiro que indica a existência do órgão vinculado à Secretaria de Segurança Pública está desaparecendo devido à ação do tempo.
O problema, no entanto, não está fora do instituto e sim dentro dele, onde a equipe de reportagem do JORNAL DA CIDADE não teve acesso. Ontem, uma ação civil pública (ACP) ajuizada pela Promotoria de Justiça do Controle Externo da Atividade Policial foi deferida pelo Judiciário sergipano determinando que o Estado efetue a transferência, no prazo de 90 dias, da atual sede do órgão para um imóvel adequado.
Na decisão, o juiz Nelson Humberto Madeira da Silva ressaltou que a inspeção técnica realizada pela promotoria demonstrou, cabalmente, que o atual prédio é residencial e funciona de maneira improvisada,sem dispor de proteção policial ou atender às normas de segurança necessárias. Como se não bastasse, o laudo de inspeção comprovou que os trabalhos ali executados são deficientes, por conta da falta de equipamentos adequados e pessoal especializado, o que contribui para a falta de provas materiais recolhidas e armazenadas.
“As investigações desenvolvidas nos inquéritos policiais em Sergipe ficam prejudicadas com a ausência de uma prova técnica robusta e consistente. Com isso, fica difícil para o Poder Judiciário condenar alguém. Muitos culpados têm sido absolvidos por falta de provas técnicas que evidenciem a tese da acusação. Ou seja, impunidade”, evidenciou Antonio Moraes, ao falar do impacto gerado pela precariedade dos serviços disponíveis no instituto.
O ex-presidente da Associação de Peritos Criminais, Armando Nascimento, disse ainda que falta treinamento para a execução do serviço. E a opinião é compartilhada com o atual representante da categoria,Antonio Moraes. “Há aparelhos que chegam graças a convênios firmados com o Ministério da Justiça, todavia os servidores não são capacitados para utilizá-los. Alguns se danificam por falta de uso”, revelou o presidente do Sinpol, destacando que o mais grave na estrutura da Coordenadoria Geral de Perícias (Cogerp), que inclui o instituto, é a desorganização dos cargos e o alto índice de desvio de função.
“O servidor não tem segurança jurídica nos seus deveres e direitos, consequentemente ele não se motiva para melhor desempenhar suas funções. Impera ainda a política dos apadrinhamentos, da velha e nefasta ingerência política. A meritocracia consiste em ser amigo de algum político para pressionar o gestor e conseguir regalias”, alegou. Esse seria um dos motivos de os funcionários não mostrarem a identidade para denunciar o que ocorre no interior do órgão.
Para se ter ideia, o instituto em Sergipe não está realizando análise pericial de documentos oficiais como papel moeda ou carteira de identidade por falta de aparelho. Segundo o coordenador geral de Perícia, Adelino Lisboa, os equipamentos estão em fase de licitação. Até mesmo o material fotográfico captado nos locais de crime sofre atraso para ser inserido em laudo por falta de pagamento destinado aos laboratórios contratados para fazer a revelação das fotos.
Fonte: Jornal da Cidade
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