sexta-feira, 2 de agosto de 2013

A POLÍCIA NÃO DEVE AGIR COMO A POPULAÇÃO QUER.

Outro dia, ouvi de um colega policial uma reclamação curiosa, onde ele expressava certo sentimento de injustiça com o tratamento dado pela imprensa ao linchamento de um suspeito de roubo. Para ele, a mídia não condenava quando a população agredia o suspeito, mas, caso fosse um policial, “o linchamento seria sobre a ação dos policiais”. Também já ouvi policiais dizerem que “todo mundo condena o policial quando recebe propina para liberar um motorista no trânsito, mas essas mesmas pessoas tentam corromper policiais quando são pegos em condição ilegal”. Essas reclamações expressam uma confusão que muitas vezes nós, policiais,fazemos: entre nossa condição profissional e nossas concepções pessoais.

Qualquer pessoa tende a se identificar com seus semelhantes e se voltar contra os diferentes. É sob essa regra que geralmente o senso comum tende a julgar o que a polícia faz, considerando justa ou injusta a ação policial. Por isso, ouvimos expressões como “vagabundo merece morrer” – quando o “vagabundo” é alguém que não conhecemos e se encaixa nos padrões que estabelecemos para nós mesmos como não “íntegros”. Da mesma forma, as pessoas dizem que ”aquele jovem (vizinho ou parente) que atropelou um mendigo, sem querer, estava apenas se divertindo, por isso acho que não deveria ser punido”.

Geralmente, quando a polícia incorpora os anseios vigentes na população, duas coisas costumam acontecer: ou se torna abusivamente repressiva ou age com leniência e excessiva flexibilidade. Isto porque, ao assumir os clamores do senso comum, o policial abdica de sua condição profissional, justamente o que o diferencia do popular, tornando-o um servidor especializado. É claro que nesta discussão “população” não quer dizer “sociedade”, o grupo de pessoas organizado por leis com legitimidade política e representativa. “População” é o senso comum, que se deixa levar por movimentos emotivos e instintivos.

Quanto menos profissional é uma polícia, quanto menos ciente de suas atribuições legais e institucionais, mais ela tenderá aos limites do abuso ou da omissão, ou seja, mais vai reproduzir o que o senso comum estabelece como adequado. Quando um policial se compara com um popular, quando reivindica o mesmo tratamento e cobrança, ele está rejeitando justamente o que deve alegar para ser valorizado: sua condição profissional, técnica. No final das contas fará o que as pessoas fazem em situações impensadas – tentarão dar um jeito de se livrar de um problema da maneira aparentemente mais simples possível, gerando efeitos perversos.

Fonte:  Abordagem Policial (Danillo Ferreira)

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