Na manhã desta quarta-feira, a assessoria jurídica da AMESE, através do advogado da área criminal, Dr. Márlio Damasceno, obteve mais uma vitória, desta feita para o vice-presidente da entidade, sargento Edgard Menezes, que foi absolvido do suposto crime capitulado no artigo 166 do Código de Penal Militar, sob a alegação de que teria censurado e desrespeitado o então comandante da PMSE à época, Cel. Aelson Resende, através do processo nº 201220601922, perante a 6ª Vara Criminal da Comarca de Aracaju (Justiça Militar).
Durante a sessão de julgamento o Dr. Márlio demonstrou que em momento algum o sargento Edgard censurou ou desrespeitou o então comandante, tendo sim expressado seu ponto de vista em relação a alguns fatos que era do interesse da corporação e da sociedade, defendo o princípio constitucional da liberdade de expressão, citando inclusive trechos de uma decisão do Ministro do STF, Dr. Celso de Melo, acerca da importância de se preservar o direito à liberdade de expressão, inclusive citando outros juristas, conseguindo convencer os julgadores que absolveram o militar por 5 X 0, ou seja, por unanimidade.
Confiram abaixo a parte final da sentença:
Proc. n.º 201220601922
ACUSADO: 1º Sgt. PMSE Nº 2764 Edgar Menezes Silva Filho
ADVOGADO: Dr. Márlio Damasceno - OAB/SE 2150
SENTENÇA
Vistos etc.
O presentante do Ministério Público Militar aforou esta ação penal contra o 1º Sgt. PM EDGAR MENEZES SILVA FILHO, já devidamente qualificado, denunciando-o como incurso nas sanções do art. 166, caput, do Código Repressivo Castrense.
Narra a denúncia que:
No dia 14 de janeiro de 2012, foi publicada uma matéria no site da Infonet, na qual o DENUNCIADO 1° Sgt. PMSE Edgar Menezes Silva Filho critica ato do Comandante-Geral da PMSE Cel. PMSE Aelson Resende Rocha, ao afirmar: “Isso é escravidão. Os oficiais que estão em serviço ordinário tem o dever de servir à população, mas quem está de folga deveria escolher se vai ou não trabalhar”.
No dia 14 de janeiro de 2012 foi realizada uma assembléia das Associações Unidas dos policiais militares,em que a categoria decidiu, entre outras coisas, não dirigir viaturas que estivessem com licenciamento atrasado ou em desacordo com quaisquer normas do Código de Trânsito Brasileiro, bem como a boicotar a segurança do evento festivo “pré-caju”.
Sobreleve-se que, neste mesmo dia, o DENUNCIADO foi entrevistado pelo portal Infonet e, ao ser ouvido, passou a criticar publicamente atos do Comandante-Geral da PMSE afirmando, em síntese, que os policiais militares de folga deveriam escolher se deveriam trabalhar no evento festivo “pré-caju”. Neste sentido, torna-se imperioso transcrevermos um trecho da entrevista: “Isso é escravidão. Os oficiais que estão em serviço ordinário tem o dever de servir à população, mas quem está de folga deveria escolher se vai ou não trabalhar”.
Enfatize-se que, na mesma matéria, o DENUNCIADO criticou a carga horária da PMSE asseverando, em síntese, que os cavalos da polícia militar tem carga horária, todavia os policiais militares não.
Assim agindo, o DENUNCIADO criticou publicamente as ações do Comandante-Geral da PMSE, bem como assuntos atinentes à disciplina militar.
Recebida a denúncia à fl. 51, foi determinada a citação e designada a Audiência de Qualificação e Interrogatório, realizada conforme termo de fl. 58, ocasião em que o incriminado confirmou que fizera as afirmações a si imputadas.
Na mesma audiência, oportunizada a manifestação a que alude o art. 407 do CPPM, a Defesa argüiu exceção de suspeição do Juiz Militar Cel. Abiner Lobo, o qual se manifestara às fls. 69/71 e se declarou suspeito.
Como não foram arroladas testemunhas de acusação, nem de defesa (v. certidão de fl. 81), foi dada vista dos autos às partes em cumprimento ao disposto no art. 427 do CPPM, oportunidade em que as partes nada requereram (v. fls. 83 e 88v).
Na fase do 428 do CPPM, o presentante do Parquet se manifestou às fls. 89/92 e pugnou pela condenação do acusado nos termos da denúncia. Já a Defesa se manifestou no sentido de apresentar suas alegações derradeiras durante a sessão de julgamento.
Saneado o processo, foi designado dia e hora para submeter o denunciado a julgamento pelo CPJM, obedecidas as disposições dos arts. 431 e seguintes do CPPM.
Assim relatados, passa-se à decisão.
Cuida-se de ação criminal visando apurar a responsabilidade do acusado 1º Sgt. PM EDGAR MENEZES SILVA FILHO, denunciado na iras do art. 166 da Lei Repressiva Castrense –PUBLICAÇÃO OU CRÍTICA INDEVIDA, assim redigido:
Art. 166. Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar publicamente, ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do governo.
Pena – Detenção, de dois meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.
De acordo com Cícero Robson Coimbra Neves e Marcello Streifinger (in Manual de direito penal militar, 2. ed. São Paulo, Saraiva, 2012, p. 820), a crítica, para ser delituosa, deve recair sobre três objetos, a saber: o ato de superior; o assunto atinente à disciplina; a resolução do governo.
Ocorre que o acusado não chegou a afrontar diretamente, com as suas declarações publicadas em portais da imprensa, ato de seu superior hierárquico, qual seja, o Comandante-Geral da PMSE. Em verdade, sua conduta consistiu em exercício do direito constitucional à liberdade de expressão, previsto no art. 5º, inciso IV, da CF/88.
Ademais, não há no caso concreto uma crítica a um ato específico de um militar “x” ou “y”, tampouco a uma penalidade aplicada a um soldado “w” ou “z”, de forma que o princípio militar da disciplina não restou afrontado.
Nesse sentido decidiu recentemente o Supremo Tribunal Federal no HC 106808/RN, julgado em 09 de abril de 2013, cujo trecho do voto do Ministro Relator Gilmar Mendes merece transcrição, a saber:
Neste ponto, resta analisar se as condutas descritas na inicial acusatória se amoldam ao delito descrito no art. 166 do Código Penal Militar, que criminaliza a conduta de “publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar publicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Governo.”
Com efeito, não há no caso concreto uma crítica a um ato específico de um militar “x” ou “y”, tampouco a uma penalidade aplicada a um soldado “w” ou “z”. No conteúdo dos protestos descritos na denúncia do Ministério Público Militar, não se questiona uma ordem específica. Há somente queixas feitas, de forma genérica, por parte da associação APEB/RN e relativas a arbitrariedades supostamente praticadas no âmbito do Exército.
Conforme a acusação feita contra o paciente, a página eletrônica da APEB/RN na Internet usa as expressões “rompantes e desmandos autoritários”, denominados no jargão militar de “r-quero”, questionando, inclusive, a violação de direitos constitucionais. Contudo, de tal publicação não se identifica afronta à disciplina militar.
Não se ignora que, nos termos do art. 142 da Constituição Federal, as Forças Armadas são organizadas com base na hierarquia e na disciplina.
Entretanto, disciplina e desmandos não se confundem. Quem critica o autoritarismo não está a criticar a disciplina.
Frise-se, ainda, que a liberdade de associação presta-se a satisfazer necessidades várias dos indivíduos, aparecendo, ao constitucionalismo atual, como básica para o estado democrático de direito.
Os indivíduos se associam para serem ouvidos, concretizando o ideário da democracia participativa. Por essa razão, o direito de associação está intrinsecamente ligado aos preceitos constitucionais de proteção da dignidade da pessoa, de livre iniciativa, da autonomia da vontade e da garantia da liberdade de expressão.
Uma associação que deva pedir licença para criticar situações de arbitrariedade terá sua atuação completamente esvaziada; e toda dissolução involuntária de associação depende de decisão judicial transitada em julgado (art. XIX, do art. 5º da CF).
Nesse contexto, trago à baila os ensinamentos de Eugênio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangelli (Manual de Direito Penal Brasileiro, Parte Geral, Editora Revista dos Tribunais, 1997, pág. 461), no sentido de que “o juízo de tipicidade não é um mero juízo de tipicidade legal, mas que exige um outro passo, que á a comprovação da tipicidade conglobante, consistente na averiguação da proibição através da indagação do alcance proibitivo da norma, não considerada isoladamente, em sim conglobada na ordem normativa.” Em suma, o tipo não pode proibir o que o direito ordena nem o que ele fomenta.
Portanto, as condutas e episódios descritos na denúncia não se subsumem ao artigo 166 do Código Penal Militar que tipifica o delito de “publicação ou crítica indevida.”
Assim, tendo em vista que o fato narrado não constitui crime, a denúncia não deve ser recebida a teor do art. 78 do Código de Processo Penal Militar.
Ante o exposto, concedo a ordem em favor do paciente Anderson Rogerio Borges dos Santos, para trancar a Ação Penal n. 0000010- 31.2006.7.07.0007, em trâmite na 7ª Circunscrição Judiciária Militar (Recife-PE).
Destarte, da análise dos autos, é forçoso reconhecer que o fato não constitui infração penal, razão pela qual impõe-se a absolvição do denunciado, com fulcro no art. 439, alínea “b” do CPPM.
EX POSITIS,
O Conselho Permanente da Justiça Militar decide, por unanimidade, julgar improcedente a pretensão punitiva Estatal, para absolver o acusado 1º Sgt. PM EDGAR MENEZES SILVA FILHO, alhures qualificado, com fundamento no artigo 439, “b” do CPPM, quanto ao delito tipificado no artigo 166 do Código Penal Militar.
Após o trânsito em julgado da sentença, a Secretaria deverá tomar as seguintes providências:
a) Oficie-se ao Comando-Geral da PMSE, para os fins cabíveis; e,
b) Arquivem-se os autos.
Sem custas..
Aracaju, 14 de agosto de 2013.
JULIANA NOGUEIRA GALVÃO MARTINS
JUÍZA MILITAR SUBSTITUTA
TC PMSE ROBSON ORNELLAS SANTOS
JUIZ MILITAR
MAJ PMSE ANDERSON MATOS DOS SANTOS
JUIZ MILITAR
CAP PMSE EDUARDO MARCELO SILVA ROCHA
JUIZ MILITAR
1º TEN PMSE ERIC SANTOS LIMA
JUIZ MILITAR
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