quarta-feira, 16 de julho de 2014

MAIS UM ASSOCIADO DA AMESE É ABSOLVIDO PERANTE A JUSTIÇA MILITAR ATRAVÉS DA ASSESSORIA JURÍDICA DA ENTIDADE.


A assessoria jurídica da AMESE, através do Dr. Márlio Damasceno, advogado da área criminal, obteve mais uma vitória para um associado da entidade, desta feita, o Sd. Marcelo Ferreira Chagas, que foi absolvido da acusação que lhe era imputada perante a 6ª Vara Criminal da Comarca de Aracaju (Justiça Militar), qual seja, a de lesão corporal (artigo 210 do Código Penal Militar), no processo tombado sob o nº 201220602643.

Durante a instrução processual, a defesa provou que o policial militar agiu em legítima defesa de terceiros, conforme os oníssonos depoimentos das testemunhas arroladas, além da prova documental adunada aos autos.

Vejam abaixo a sentença prolatada pelo Juiz Militar que absolveu o associado da AMESE:

Processo nº 201220602643

Autor:  JUSTIÇA PÚBLICA

Réu:  MARCELO FERREIRA CHAGAS

Advogado:  MÁRLIO DAMASCENO CONCEIÇÃO - OAB/SE 2.150

É o relatório.

Decido
 
Cuida-se o presente de ação criminal visando apurar a responsabilidade do acusado Sd. PMSE nº 6824 MARCELO FERREIRA CHAGAS, denunciado nas iras do art. 210, caput, do Código Penal Militar – Lesão Corporal Culposa.
 
Art.210. Se a lesão é culposa:

Pena - detenção, de dois meses a um ano.

Com efeito, o direito de punir do Estado visa, dentre outros fins, intimidar as pessoas que transgridem as leis, objetivando manter a harmonia e a ordem no meio social, assegurando a paz e a tranquilidade na sociedade, configurando o interesse público que fundamenta a ação penal, a qual deve ser exercida dentro dos parâmetros constitucionais do devido processo legal.
Entretanto, para que o Estado-Juiz aplique a sanção, é necessário que haja a certeza dos elementos objetivos e subjetivos descritos na norma tipificadora da conduta delitiva e, também, que não esteja presente qualquer circunstância descriminante ou causa excludente de culpabilidade.
Ensina-nos Cícero Robson Coimbra Neves e Marcello Streinfinger acerca do delito de Lesão Corporal Culposa que essa previsão delitiva tutela a integridade física e a saúde física e mental da pessoa humana(p. 1011). Neste tipo penal não se mensura o grau da lesão, pois o agente não pretendia nem assumiu o risco de sua ocorrência. Assim, o delito se consuma quando a integridade física, a saúde física ou mental da pessoa é turbada, sendo necessária a comprovação médica da lesão, trazida aos autos.
No caso em apreço, a materialidade esta comprovada através do Laudo de Exame Pericial de fls. 186/188. Ademais, a autoria também esta evidenciada. Senão, veja-se os depoimentos:
Em seu interrogatório em Juízo (mídia anexa no termo de audiência de fls.249), o denunciado Sd. PMSE nº 6824Marcelo Ferreira Chagasnegou a prática delitiva a ele imputada na exordial acusatória. Relatou que participava de uma blitz da lei seca. A função do interrogado era de segurança. Afirmou que um de seus colegas determinou a parada de um veículo que era conduzido pelo Policial Civil Anilson, que indignado se negou a fazer o bafômetro e portava uma arma na cintura. Por conseguinte, o policial civil entrou no veículo e saiu em disparada, derrubando um dos policiais militares no chão. Nesse momento, o interrogado ouviu um estampido e imaginou que seu colega tinha sido alvejado. Como fazia a segurança da guarnição efetuou um disparo para cima, mesmo assim “Catita” direcionou o veículo em direção do interrogado, que foi obrigado a disparar mais um tiro, desta feita em direção ao pneu do carro,mas não conseguiu atingir o alvo. Eram 02:30 da madrugada e não tinham muitas pessoas próximas por conta do horário. Relatou que não sabe quem efetuou o primeiro disparo. Os policiais informaram que “Catita” apresentava sinais de embriaguez. Disse que um condutor de veículo foi atingido por um tiro, mas que da posição que se encontrava na blitz era impossível que seu disparo chegasse até o carro da vítima. A vítima estava em um outro veículo, que também tinha sido parado pela blitz. Foram três tiros, um primeiro que não sabe quem disparou e os outros dois efetuados pelo declarante: um para o alto e o outro em direção ao pneu do carro que era guiado pelo policial civil “Catita”. Portava uma carabina e uma pistola que ficou a todo tempo no coldre. Conhece o policial civil que se negou a fazer o teste do bafômetro pelo apelido de “Catita”. Não conseguiram pegá-lo durante a perseguição.
Em seu depoimento a testemunha Ten. PMSE Alisson Rodrigo de Souza Aguiar confirmou suas declarações de fls. 32/34. Narrou que o acusado tinha a função de segurança da blitz e estava posicionado no final das baias da blitz. Afirmou que a vítima estava em um carro atrás do veículo do Policial Civil “Catita”. Asseverou que esse estava armado (Pistola .40), mas que acredita que que a arma não tenha sido apreendida para ser periciada, já que ele (Catita) empreendeu fuga do local e não foi localizado. Quando o Policial Civil acelerou o carro, o declarante, se jogou no carro para não ser arrastado pelo veículo e visualizou o réu efetuando um disparo em direção a lateral do veículo de Catita, na parte inferior. Disse que percebeu uma única perfuração no veículo de Péricles, que acredita que tenha sido a mesma bala que perfurou o para-brisa e atingiu a vítima. Não viu outro policial atirando e que somente o réu encontrava-se na condição de atirar. Ouve um comentário que se ouviu um disparo e depois foram ouvidos outros disparos efetuados pelo réu. Acredita que só o réu tenha atirado,pois não observou nenhum outro policial empunhado arma de fogo. A função do réu era fazer a segurança dos policiais e das pessoas que eram abordadas. Catita não queria realizar o teste de bafômetro. Com a arrancada do veículo, o policial civil Catita colocou a integridade física dos policiais militares integrantes da blitz em risco. Afirmou que os policiais ouviram um estampido e que após esse primeiro outros tiros foram disparados.
Em sua oitiva a testemunha Sd. PMSE Marcos Valber Barroso dos Santos, confirmou o teor do depoimento de fls.41/42. Narrou que ouviu um disparo e, depois, ouviu uma sequência de disparos. O barulho dos tiros era o mesmo. Havia cerca de 20 a 25 policiais. Asseverou que o Policial Civil “Catita” jogou o carro para cima dos policiais e dos civis que ali estavam. O declarante e outros policias tiveram que desviar do carro para não serem atropelados, já que o policial civil arrancou com o carro em direção dos militares integrante da blitz. Afirmou que quando visualizou o réu atirando já foi no final da blitz, onde o denunciado se encontrava fazendo a segurança da guarnição. Confirmou que o Policial Civil colocou em risco a vida do Tenente que estava tentando retirar a chave da ignição e de todos os outros policiais. Perguntado qual é a orientação que os policiais militares recebem para esse tipo de situação, o declarante disse que não são preparados para uma ocasião como a posta nos autos, cabendo ao policial, na hora, decidir qual medida tomar.
A testemunha de defesa Cap. PMSE Fábio Luiz Silva Machado ratificou o depoimento de fls. 51/53. Afirmou que comandava a operação da blitz e que Chagas (denunciado) ficou designado para ser segurança. Narrou que o Policial “Catita” o chamou para conversar e ele percebeu os sinais de embriaguez, mas que pediu um tempo que já se dirigia a ele para falar. No entanto, nesse momento ouviu um disparo e uma frenagem, avistando o disparo de Chagas na retaguarda do veículos e por sequência percebeu que tinha um cidadão ferido. Ao acelerar o carro o Policial Civil “Catita” quase atropela outros policiais militares. Acredita que o que levou o réu a efetuar os disparos foi o fato de “Catita” ter partido em disparada com o carro e quase atropelado os militares integrantes da blitz. Viu o acusado mirar na direção do pneu do carro, inclusive viu as balas ricocheteando no asfalto. A vítima afirmou que viu “Catita” com arma em punho. Se houver uma injusta agressão da pessoa abordada, o segurança da blitz está autorizado a disparar, não havendo, deve buscar outros meios para tentar impedir a fuga de uma blitz.
O Cb. PMSE Helder José Batista dos Santos, ratificou o depoimento prestado às fls.39/40. Disse que escutou um tiro e depois uma sequência de três disparos, provavelmente disparados pelo Sd. Chagas, ora acusado.Não sabe dizer se o disparo isolado, antes da sequência, foi efetuado pelo réu, porém acredita que não. O motivo dos disparos efetuados pelo acusado foi que o policial catita tentou arrastar o carro por ima dos policiais militares, derrubando o tenente. A vítima foi atingida de forma acidental. O carro da vítima estava atrás do carro de catita. O acusado disparou na lateral do veículo de catita, mirando os pneus. Nesse momento, o carro da vítima estava parado no corredor da blitz, atrás do carro de catita , de modo que é muito difícil que os disparos efetuados pelo acusado tenham atingido o carro da vítima.
A Ten. PMSE Fabíola Gois confirmou o depoimento de fls.43/45. Não viu os disparos, só os ouviu. Não sabe precisar a quantidade de disparos, sabendo que foi mais de um. Catita estava visivelmente embriagado e se recusou a fazer o teste do bafômetro e entregar os documentos.
Em seu depoimento , o Sgt. PMSE Manoel Messias dos Santos também
ratificou o depoimento prestado em sede policial (fls. 48/49). Afirmou que viu o policial civil “Catita” com uma arma na mão, mas que não sabe de onde partiu o primeiro disparo. Narrou que não se recorda quantos foram os disparos, mas que percebeu que os disparos sequenciais foram efetuados pelo segurança da blitz, o denunciado. Afirmou que o veículo em que se encontrava a vítima não estava entre o acusado e o Policial Civil “Catita”.
Assim, através do contexto probatório demonstrou-se que o disparo foi efetuado pelo réu como meio de repelir uma suposta agressão imposta pelo Policial Civil “Catita”. Como relatado nos depoimentos, o réu ouviu um estampido e por acreditar que o Policial Civil “Catita” (que estava armado) teria disparado um tiro, reagiu efetuando disparos na direção do seu veículo.
Nesse caso, considerando-se que o réu agiu acreditando estar diante de uma agressão injusta e iminente, e, portanto, supôs erroneamente que estava diante de uma causa que justificaria a sua conduta (disparar a arma), presente esta a legitima defesa putativa. Como ensina Linhares1,aplicada à defesa, referida expressão (legitima defesa putativa) quer dizer reputar, pensar ou crer que temos de nos defender contra uma agressão que, em verdade, não existe, mas parece real. Para ZAFFARONI, trata-se a legítima defesa putativa de "uma causa de ausência de culpabilidade, motivada no erro, que impede a compreensão da antijuridicidade da conduta".1
Acerca desse assunto, é o entendimento do Superior Tribunal Militar:

HOMICIDIO QUALIFICADO. MOTIVO FUTIL. TRAIÇÃO. LEGITIMA DEFESA PUTATIVA. VIOLENTA EMOÇÃO. 1. RESTANDO COMPROVADO NOS AUTOS QUE ANTES DO CRIME OCORREU DISCUSSÃO ENTRE VITIMA E REU. DESCARACTERIZADA ESTA A QUALIFICADORA DE MOTIVO FUTIL. POR OUTRO LADO, NÃO HA QUE SE CONFUNDIR MOTIVO FUTIL COM MOTIVO INJUSTO. 2. TRAIÇÃO. COMPROVADO DURANTE A INSTRUÇÃO CRIMINAL QUE O REU DISPAROU SUA ARMA CONTRA A VITIMA, PELAS COSTAS, TIPIFICADA ESTA A TRAIÇÃO FISICA, ERIGIDA NO CPM A CATEGORIA DE QUALIFICADORA (ART. 205, PARÁGRAFO SEGUNDO. INCISO IV). 'A FORMA TIPICA DE ACOMETIMENTO 'A TRAIÇÃO E A QUE COLHE A VITIMA DE CHOFRE, PELAS COSTAS' (NELSON HUNGRIA). 3. LEGITIMA DEFESA PUTATIVA. PARA SUA CARACTERIZAÇÃO, E NECESSARIO QUE ALGUEM, POR ERRO PLENAMENTE JUSTIFICADO PELAS CIRCUNSTANCIAS. REFUTE AGRESSÃO INJUSTA, ATUAL E IMINENTE, A DIREITO SEU OU DE OUTREM. 4. VIOLENTA EMOÇÃO. ESTA MINORANTE FACULTATIVA DA PENA SOMENTE PODE SER CONSIDERADA (STM - Apelfo: 46571 MS 1991.01.046571-5, Relator: CHERUBIM ROSA FILHO, Data de Julgamento: 11/06/1992, Data de Publicação: Data da Publicação: 19/08/1992 Vol: 01392-01 Veículo: DJ)

Por estas razões, tendo em vista que o agente atuou na sincera e íntima convicção da necessidade de debelar a agressão injusta e atual de maneira justificada pelas circunstâncias fáticas, a medida cabível é a absolvição.
 
EX POSITIS,
 
Ante o exposto, julgo improcedente a pretensão punitiva estatal, para ABSOLVER o denunciado, Sd. PMSE nº 6824 MARCELO FERREIRA CHAGAS, alhures qualificado, da acusação da prática do delito previsto no art. 210, caput, do Código Repressivo Castrense, fulcrado no art. 439, alínea “d”, do Código de Ritos Militar.
Após o trânsito em julgado da sentença, a Secretaria deverá tomar as seguintes providências:
 
a) Oficie-se ao Comandante Geral da PMSE, cientificando-o desta decisão, encaminhando-lhe cópia;
 
b) Oficie-se, ainda, ao Núcleo de Identificação, da Superintendência Regional em Sergipe, do Departamento de Polícia Federal, para os fins cabíveis.
 
P.R.I.
 
Aracaju, 11 de julho de 2014.
 
DIÓGENES BARRETO
Juiz de Direito

1LINHARES, Marcelo Jardim. Legítima Defesa. 2. ed. Rio de Janeiro:Forense,1980. P.282
1 ZAFFARONI, Eugenio Raul; PIERANGELI, José Henrique. Manual do Direito Penal Brasileiro: parte geral. 2. ed., rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. P.639

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