quinta-feira, 11 de setembro de 2014

SEM COMISSÃO DA VERDADE.


As discussões a respeito do período da Ditadura Civil-militar fazem parte de um passado ainda muito próximo. No Nordeste, em particular Sergipe, as experiências (de resistência) e o jogo de interesses deflagrados frente à “nova ordem política” imposta, a partir de março de 1964, foram diversos, contraditórios e, em parte dos casos, traumáticos. Em Sergipe, esses interesses e contradições revelam significados a respeito de como a sociedade tem dificuldade em lidar com esse passado, a ponto de ser um dos poucos estados do país a não possuir uma comissão (estadual da) verdade. 

Não obstante às críticas, o resultado alcançado por essas comissões tem repercutido na interpretação sobre esse passado, como pode ser observado nas temáticas escolhidas para discussões de vários fóruns acadêmicos durante o ano de 2014, cujo foco é o debate sobre a Ditadura. Neste sentido, tanto a Comissão Nacional da Verdade (CNV) quanto às comissões estaduais da verdade, embora estejam concentradas nos estudos de crimes contra a violação dos direitos humanos – deixando de fora outros tipos de violações de direitos contra indivíduos, grupos ou instituições –, têm convertido experiências de resistência e apurações de denúncias em debates sobre o exercício da cidadania e os limites do controle do Estado no Brasil.

Mas, até o momento, essa repercussão não foi suficiente para mobilizar a sociedade, os partidos políticos (de esquerda e de direita) e o “Estado” em Sergipe para criação de uma comissão congênere. Sob o ponto de vista dessa reflexão, isto pode revelar dois pontos de interpretação: o de que a sociedade não teria interesse nessa comissão; ou que há dificuldade da sociedade em lidar com as contradições desse passado e de sua imbricada teia de relações.

Partilhando da segunda interpretação, observei que nos jornais os primeiros debates a respeito datam de janeiro de 2012, e o primeiro fórum sobre a questão, promovido pelo Ministério Público Federal (SE), ocorreu em fevereiro do mesmo ano.  Em seguida ocorreram algumas tentativas para criação de uma comissão estadual, mas apesar do contexto favorável, tanto em âmbito nacional quanto no âmbito de outros estados, o consenso e a vontade para a respectiva criação não foram encontrados.

Recentemente, em período de férias, ao voltar às terras de Sergipe, ouvindo um conhecido programa de rádio vespertino, acompanhei a entrevista do atual Secretário de Direitos Humanos do Estado, que, ao contrário de seu antecessor, parece demonstrar, por razões de formação e origem, um maior entusiasmo frente à questão da referida comissão. Entretanto, o problema agora parece reformular-se em razão das prioridades e das incertezas comuns aos períodos eleitorais.

Pelo visto, o problema de Sergipe não é o da criação de uma comissão estadual da verdade, iniciativas já realizadas por outros estados, inclusive Alagoas e a Bahia. O problema que se coloca são as razões para a não criação dessa comissão.

Texto escrito por José Vieira da Cruz (Historiador e Professor da UFAL)

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