por JOÃO NASCIMENTO, AMASE
ENTREVISTA - GUSTAVO PLETCH, presidente da AMASE (Associação dos magistrados de Sergipe)
Em entrevista, presidente da AMASE propõe Pacto Republicano Por Sergipe:
1 - Como a AMASE enxerga a atual situação do Estado de Sergipe?
Com muita preocupação, mas tudo isso era previsível e, por diversas vezes, enquanto entidade de utilidade pública assim reconhecida por lei, fizemos, via AMASE, os devidos alertas! Infelizmente os administradores não pensam as Instituições como algo permanente e acabam ‘planejando’ apenas a sua gestão, e até esse período curto, às vezes, é mal planejado, e tudo isso implica numa série de problemas que, mais cedo ou mais tarde, acabam aflorando.
Seria leviano apontar esse Governo como o grande e exclusivo responsável pela caótica situação atual, embora, na nossa avaliação, tenha também sua elevada parcela de responsabilidade pela não adoção prematura de medidas de contenção, ou pelo menos de todas as medidas necessárias. É fato, porém que o estrago que agora se revela de forma aguçada é fruto de anos e anos de administrações pouco voltadas ao fortalecimento do Estado, mal planejadas para o futuro.
Hoje o maior gargalo do Estado é o déficit previdenciário e perdemos no passado boas oportunidades de fortalecê-los, como por exemplo, empregando neles os valores fruto de privatizações, alguns de elevada monta como da então Companhia Energética de Sergipe, que, certamente, tivesse sido na época empregada na Previdência do Estado, nos faria hoje figurar em situação positiva de destaque, a exemplo de outros Estados que ao privatizarem serviços investiram nos fundos de previdência. Hoje o Estado precisa fazer um milionário aporte mensal para cobertura do déficit. É apenas um exemplo da política pública equivocada e da visão imediatista da grande maioria, levando-nos hoje a atual situação.
2 - O Estado então demorou a adotar providências?
O Estado efetuou algumas reformas importantes, ainda que tardias, mas que em sua maioria só servirão para amenizar, minimamente, as consequências futuras do crescimento de seus custos relativos a pagamento de servidores em geral. Exemplo principal foi o fim das incorporações, luta comandada pela AMASE; o corte do terço devido após 25 anos de serviço também não encontrava legislação similar no Brasil, além de ser perversa com a previdência, pelo que foi medida acertada. Todavia, sendo essas medidas insuficientes para o enfrentamento do momento de crise, o Estado está em mora em realizar uma profunda, séria e austera reforma administrativa, que deve ser fruto de um pacto republicano a ser acordado entre os Poderes e principais Instituições.
3 - Como a AMASE enxerga o não repasse constitucional ao Poder Judiciário na data devida? E por que o Estado chegou a esse estágio?
Em nossa avaliação a falta do repasse na data correta é uma afronta a um Poder independente do Estado e, teoricamente, pode ensejar a prática de crime de responsabilidade por parte do governante, pois assim previsto na Carta Magna. A magistratura não aceita esse desrespeito ao Poder e as leis, e adotará todas as medidas legais e legítimas que estejam ao seu alcance, no momento oportuno e conveniente do ponto de vista jurídico.
Esse estágio é consequência da falta de visão republicana ao longo dos tempos e o uso do Estado como fomento dos apoios eleitoreiros e acomodações políticas, o que ocorre não só em Sergipe como em todo o Brasil, de regra. Friso que nós magistrados somos apartidários e que a avaliação associativa é desprovida de viés político partidário, cingindo-se apenas a nossa participação como entidade que deve se voltar ao interesse público e que se preocupa com o presente e futuro de nosso Estado e as consequências daí advindas.
Talvez houvesse a equivocada impressão de que o Estado era infalível e que haveria suporte para tocar os serviços públicos sem abrir mão dos apadrinhamentos e das colocações políticas, a exemplo da Casa Civil que, quase sempre, Governo pós Governo, sempre esteve lotada por cabos eleitorais às expensas do Erário. Outro exemplo perfeito do mau uso do Estado são as famigeradas incorporações, acima citadas e que por longo tempo foram admitidas pela própria Legislação Estadual, enquanto na esfera federal tal prática já havia sido abolida há mais de 20 anos! Mesmo extintas, seus efeitos ainda serão suportados pela Administração Pública nos próximos 50 anos, a exemplo de alguém que com 30 anos já tenha incorporado um cargo e que tenha entre atividade e inatividade uma expectativa de viver ate os 80 anos! Essa conta caberá a sociedade pagar.
Quanto a estas incorporações, não obstante “legais”, se revestiam de cunho forte de inobservância ao princípio da moralidade pública, não por parte de quem dela se beneficiava, que obviamente se valia de texto legal vigente, mas por conta de uma lei desatenta a moralidade e perversa no seu próprio conteúdo e propósito. O mais drástico, porém, é que após um determinado lapso temporal – a partir do quinto ano - o servidor, incorporava a metade da gratificação e a cada ano seguinte o restante dela, chegando a sua totalidade. E para completar o efeito devastador nas contas públicas, uma vez incorporado o cargo aos vencimentos o servidor era exonerado do cargo para que fosse dada a vez para que outro o incorporasse, fazendo com que o mesmo cargo fosse incorporado “N” vezes. Além de tudo isso, a forma de provimento desses cargos, principalmente os de maior monta, quase sempre não se baseava nos critérios mais republicanos e justos de observância de mérito!
Mesmo com o fim das incorporações dos Ccs e sem aplicação dela para os novos comissionados, é preciso restringir o número de cargos ao estritamente necessário em todos os Poderes, órgão e instituições do Estado. De mais a mais os cargos comissionados precisam ter seus valores ajustados à responsabilidade da função, não sendo razoável que o valor da comissão seja até 7, 8 vezes superior a própria remuneração do cargo. Sendo o cargo tão importante a ponto de merecer elevado comissionamento, melhor supri-lo pela via do concurso público, sempre mais transparente, justa e igualitária.
Quero deixar claro que não retiramos aqui a importância dos cargos comissionados, sabemos que eles são necessários e legais, mormente em situações em que a relação de confiança que se dá pela livre escolha é fundamental para algumas funções de estrita confiança. O que não se pode é criar cargos para acomodar pessoas!
4 - Qual hoje a maior preocupação da AMASE?
A maior preocupação é com o Sergipeprevidência! O Instituto está falido e em 2016 deve levar algo em torno de 23 a 25% da receita líquida do Estado para a cobertura do déficit e isso obviamente implica em insuficiência em outros setores, já que a fonte é uma só, a arrecadação e repasses recebidos pelo Estado.
Embora em seu comando – do Sergipeprevidência - esteja um técnico competente e experimentado, o Dr Augusto Fábio, que busca constantemente soluções, a verdade é que o caos instaurado é matematicamente invencível, servindo boa parte das ações objetivas apenas para amenizar muito suavemente a situação.
Assim, os aposentados do Estado estão em constante situação de risco, a ponto de já agora em 2015 terem tido seus décimos terceiros parcelados em 06 vezes a partir de janeiro vindouro, o que é ilegal e absurdo!
É preciso que se faça uma ampla revisão da legislação pertinente, e a AMASE apóia e quer colaborar com as idéias do Presidente do Sergipe Previdência, pois enxerga que o sistema não se sustenta da forma atual. Pensão não pode ser meio de vida, ressalvado os casos de efetiva e justificada dependência. Algumas legislações específicas também precisam ser modernizadas e mesmo assim todas essas medidas só terão eficácia para médio e longo prazo.
Outra grande preocupação é com a adimplência do Estado junto a seus compromissos com o pagamento das dívidas. Tememos que eventual atraso impeça repasses constitucionais, a exemplo do que aconteceu no Rio Grande do Sul e isso, fatalmente, tornaria a situação ainda mais atormentadora, se é que é possível.
5 - O que a AMASE propõe?
Entendemos e temos repetido a necessidade de UM PACTO REPUBLICANO envolvendo os 03 Poderes e as principais Instituições, a exemplo do MP E TCE.
Nesse pacto deve-se pensar o Estado em longo prazo a partir da implementação de medidas moralizadoras de contenção, a iniciar com uma redução drástica dos custos do Estado, de modo a economizar o número possível para mitigação da crise, o que trará também um ganho no conceito moral das Instituições.
Não estamos a dizer que medidas de economia não estão sendo adotadas. Temos conhecimento de que algumas Instituições deram inicio a essas providências, a exemplo do Judiciário e MP, mas precisamos aprofundar essa tarefa. No Judiciário a AMASE aplaudiu o corte recente de mais de 75 cargos em Comissão e acompanhou a pressão natural sofrida pelo Presidente em face disso. Todavia ainda se pode fazer mais, seja para enfrentar a crise seja para aplicar eventual sobra onde se necessita de maiores investimentos. No Judiciário, especialmente, qualquer economia deve ser revertida para o enfrentamento da própria crise, a garantia de pagamento de seus membros e servidores e, sobretudo a aplicação no Primeiro Grau de Jurisdição, onde se encontram as maiores dificuldades e por onde corre o maior número de feitos.
Essa reforma deve começar pela reavaliação dos cargos comissionados, não apenas em seus quantitativos mais também em seus valores e do quanto real e necessário para atender bem ao serviço publico.
Precisamos repensa toda a estrutura do Estado, e quando falo em Estado não estou a excluir nenhum Poder ou Órgão. É preciso uma mudança de mentalidade capaz de enfrentar uma situação adversa. Como exemplos é preciso estudar a existência e necessidade dos famosos Conselhos, cujos participantes recebem jetons que chegam a cifras anuais bem razoáveis, fala-se em até R$ 70 mil ano. Enfim, encontrar os excessos e efetivar os consertos.
Em épocas de crise a criatividade deve ser potencializada, a fiscalização deve ser dobrada e a contenção deve ser a palavra de ordem. Outro tema que pode e deve ser reavaliado é quanto a necessidade de frotas oficiais de veículos em todos os Poderes, MP, TCE, Secretarias, Autarquias, enfim, com custos elevados de manutenção, renovação, seguros, combustível e motorista, , quando o exercício do cargo e sua autoridade não estão vinculados ao uso de um carro oficial, e sim a conduta e decência de quem o exerce. A crise financeira e o momento atual não comportam práticas já abolidas em algumas instituições há décadas, como no TJ do Rio Grande do Sul, onde já faz 20 anos que apenas se mantém o carro de representação da Presidência e da Corregedoria, esses obviamente necessários. Em suma, há muito que pode ser feito, assim como faz um pai de família quando fica desempregado ou quando sofre déficit em seus rendimentos, ou uma empresa que passa por crise: readequar-se para o enfrentamento, isso é o que precisa ser feito, e com a consciência de que a crise deve se agravar (ainda mais) nos próximos 02 anos, projetam os economistas!
São apenas exemplos, dentre tantos, de economias que podem ser implementadas, sem qualquer déficit na prestação do serviço!
6 - Mas os juízes não recebem algumas verbas questionáveis, como o auxilio moradia e que oneram o erário público, também em momento de crise?
Essa é uma situação que muito nos preocupa, e que inclusive causa dissabores internos, por que sendo verba indenizatória os nossos magistrados aposentados não recebem a verba. Assim, logo de início, digo que toda a magistratura preferiria o fim do auxílio moradia, embora legal, e o retorno do nosso tempo de serviço, que nos foi subtraído e que nos constitui em uma das poucas classes que não recebe o que inclusive retira o sentido de uma profissão de carreira.
O auxilio moradia nunca foi compreendido pela sociedade, e é razoável essa dificuldade, por conta do contexto geral e desconhecimento de nossas funções, privações e responsabilidades.
Desde sempre tenho sido interpelado acerca desse tema e quando não sou eu mesmo o provoco como forma de esclarecer a nossa visão e estabelecer o devido contraponto.
A AMASE tem estabelecido um diálogo franco e transparente com a sociedade, sem caixa preta. A legalidade do pagamento é indiscutível, até porque decisões do STF e do CNJ garantem seu adimplemento. E se alguém disser, numa visão linear, que é imoral tal pagamento, o que é preciso saber é que os magistrados enfrentam privações próprias da carreira inseridas em a lei e a existência de determinadas vantagens servem também para torná-lo atrativo e compensar as imposições próprias da função. O benefício está previsto na Loman há muitas décadas.
O auxilio moradia é recebido também por outras classes e não apenas pelos juízes, embora muitos acreditem que apenas o Judiciário paga. O que não se sabe e nem se lamenta, porém, é que os magistrados de Sergipe estão tendo questionado o seu direito a Licença Premio, o que é garantido a todas as carreiras jurídicas do Estado, menos a nossa; o que não se sabe também é que os magistrados dão plantões gratuitos; o que não se sabe também é que os magistrados tiveram solapado seu tempo de serviço, ao passo que todos os que servem o Estado fazem jus a triênios e evolução em níveis e letras, e que o prejuízo do tempo de serviço é maior que o benefício do Auxilio, até porque o auxilio não é pago a magistrados aposentados.
O que não vira nota nem notícia é que a magistratura nacional chegará a 2016 com déficit de recomposição (não aumento) em seu subsídio da ordem de mais de 40%.
O magistrado precisa perceber de acordo com a responsabilidade de suas funções e uma magistratura fraca significará o fim das garantias sociais e da democracia nesse País. Precisamos sim de juízes bem remunerados.
Há uma falsa noção de que os magistrados são os profissionais mais bem remunerados da nação. Não é assim! No próprio setor público encontramos salários bem superiores em Autarquias, Sociedades de Economia mista, Secretarias de Estado, e embora funções relevantes nenhuma delas, com a responsabilidade de um magistrado de decretar prisões, dividir patrimônios, decidir guarda, autorizar um aborto, enfim.
Ademais, existem verbas próprias de algumas classes, a exemplo de empresas e sociedades de economia mista que pagam para seus funcionários participações em lucros; existem cargos jurídicos públicos que recebem sucumbência e penso que são conquistas de classe e que estão acessíveis a todos que queiram se submeter aos concursos para os referidos cargos.
Magistrados não são cargos comissionados e muito menos apadrinhados do serviço público. Magistrados fazem dificílimo concurso e exercem cargo exclusivo, não podendo desenvolver outra atividade, salvo magistério superior. Em sua maioria provêm das classes média e baixa, e esse espaço é acessível a todos, também pela via mais justa e igualitária, o concurso público.
Os magistrados não estão a questionar conquistas de outras classes! Estamos sim propondo um mutirão de práticas positivas, fim dos excessos e supremacia do interesse público, o que chamamos de PACTO REPUBLICANO POR SERGIPE, buscando o bem de todos os que vivem em nosso Estado.
Fonte: NE Notícias
Nenhum comentário:
Postar um comentário