segunda-feira, 24 de outubro de 2016

CRIME ORGANIZADO: MILÍCIA E TRÁFICO FECHAM ALIANÇA.

Em permanente expansão e mutação, milicianos estendem seus negócios do narcotráfico até as eleições


Os traficantes erguem os fuzis e lançam ameaça em vídeo do YouTube: “Olha como nóis tá pesadão. Pode subir o escadão que não passa nada”. A resposta veio só em áudio: “O bagulho é nosso, seus comédias. Aqui é tudo milícia”. O confronto no Morro do Jordão, em Jacarepaguá, zona oeste do Rio, durou um ano de tiros e mortes. Terminou após um acordo de anexação: a milícia vendeu seu território ao CV, o Comando Vermelho, por R$ 3 milhões. Passou-se o ponto.

Não foi a primeira nem a última transação desse tipo. Tráfico e milícia mostram cada vez mais flexibilidade num mercado que, como tantos outros, se autorregula. Na favela do Aço, em Campo Grande, também zona oeste do Rio, a facção Terceiro Comando Puro contratou milicianos para fazerem segurança - o “job” é pago com 50% do lucro das operações. É verdade que a milícia cresceu muito há dez anos com a promessa de combater as drogas e proteger a população local, mas nos últimos tempos a “gestão” optou por uma aliança estratégica com o narcotráfico (ou seria uma “joint venture”?).

“O discurso moral do início era só um disfarce. O que eles querem, como qualquer criminoso, é o lucro”, afirma Ignacio Cano, professor do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e autor do livro “No Sapatinho - A evolução das milícias no Rio de Janeiro (2008-2011)”.

As milícias se espalharam por todo o Estado do Rio, além de cidades de norte a sul do país. Também deixaram o leque inicial de segurança-gás-gatonet-van e avançam sobre o setor imobiliário. Nas eleições de 2016, uma das mais violentas da história do Brasil, estão envolvidas em mortes de candidatos e até cobraram taxas de políticos que fizeram campanha em seus domínios.

“Os depósitos de mercadoria e as empresas de logística gostam da milícia por perto para evitar roubo de carga. O sistema lícito se arranja com o ilícito”, afirma a especialista Alba Zaluar, professora de antropologia da UERJ (Universidade Estadual do Rio). Os chefes milicianos são funcionários públicos (ou ex) que agem como senhores feudais e planejam como executivos capitalistas. Novos capítulos da teoria econômica estão sendo escritos nas ruas suburbanas de uma maneira que nem Adam Smith ou Karl Marx poderiam imaginar.

Fonte:  TAB/UOL (Rodrigo Bertolotto)

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