Confesso: É um misto de perplexidade e déjà vu a mais recente manobra tributária do governo Lula. Depois de aumentar o IOF e enfrentar uma onda de críticas, o Planalto agora anuncia um “recuo estratégico”: vai reduzir as alíquotas do imposto, mas compensará a perda de arrecadação taxando as bets e acabando com isenções de títulos como LCI e LCA. É como trocar seis por meia dúzia, ou melhor, trocar um imposto por vários outros.
O NOVO CARDÁPIO DE IMPOSTOS
Vamos aos fatos, porque eles são teimosos e não se dobram a discursos populistas. Segundo anúncio feito pelo ministro Fernando Haddad nesta segunda-feira (9), o governo vai “recalibrar” o decreto que aumentou o IOF, reduzindo em um terço a arrecadação prevista com a medida. O que seria motivo de comemoração para o contribuinte logo se revela uma ilusão: para compensar a perda de receita, o governo apresentará uma Medida Provisória com três novas fontes de arrecadação:
1. Aumento da tributação sobre as bets (casas de apostas online), que passarão a pagar mais impostos;
2. Fim da isenção de Imposto de Renda para LCI e LCA, títulos de investimento que até agora eram isentos para pessoas físicas;
3. Corte linear de 10% em benefícios tributários que não estão protegidos pela Constituição.
Como diria minha avó: “Tirou do bolso direito para enfiar no esquerdo”. E o mais irônico é que o governo apresenta isso como uma grande concessão, um gesto de boa vontade para com o sofrido contribuinte brasileiro.
A MÁQUINA DE CRIAR IMPOSTOS
O episódio do IOF e sua “compensação” é apenas o capítulo mais recente de uma saga que começou em janeiro de 2023. Segundo levantamento da Gazeta do Povo, o governo Lula já aumentou ou criou impostos pelo menos 24 vezes desde o início do mandato – uma média de um novo tributo ou aumento a cada 37 dias.
Entre as medidas adotadas nos últimos dois anos e meio, destacam-se:
• Reversão de alíquotas de PIS/Cofins sobre receitas financeiras (janeiro/2023)
• Retomada da tributação sobre combustíveis (março/2023)
• Taxação de compras internacionais de até US$ 50 (julho/2023)
• Aumento do imposto de importação de painéis solares (janeiro/2024)
• Limitação da compensação de créditos tributários (abril/2024)
• Aumento do IOF (maio/2025)
• Taxação de fundos exclusivos e offshore (janeiro/2024)
• Fim da dedução dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) (janeiro/2024)
E agora, em junho de 2025, temos mais três medidas tributárias de uma vez só. É como se o governo tivesse uma meta mensal de criação de impostos a cumprir.
OS NÚMEROS POR TRÁS DA FOME FISCAL
O resultado dessa sanha arrecadatória é impressionante. Segundo dados da Receita Federal, a arrecadação federal bateu recorde em 2024, totalizando R$ 789,1 milhões com diárias, passagens e locomoção – também o maior valor já registrado.
Com o aumento do IOF, o governo esperava arrecadar cerca de R$ 13 bilhões. Mas não se preocupe: as novas medidas compensatórias garantirão que o Leão não perca nem um centavo de sua refeição.
O ministro Haddad afirmou que os títulos como LCI e LCA “deixarão de ser isentos, mas continuarão bastante incentivados”. É como dizer a alguém que você vai tirar seu braço, mas deixará o cotovelo. Uma generosidade comovente.
O QUE ESTÁ POR TRÁS DE TUDO ISSO?
A pergunta que não quer calar é: por que tanta sede por arrecadação? A resposta oficial é sempre a mesma: necessidade de equilibrar as contas públicas, cumprir a meta fiscal, garantir a sustentabilidade da dívida. Palavras bonitas que escondem uma verdade incômoda: o governo gasta muito mais do que arrecada e, em vez de cortar despesas, prefere aumentar a carga sobre o contribuinte.
Em 2024, o déficit primário do governo central foi de R$ 230,5 bilhões, o pior resultado desde 2020, ano da pandemia. Para 2025, a meta é um déficit zero, algo que parece cada vez mais distante, apesar de toda a criatividade tributária de Haddad.
O mais curioso é que, mesmo com tantos aumentos de impostos, o governo ainda prevê déficit nas contas até o fim do mandato de Lula. É como um paciente que toma remédios cada vez mais fortes, mas continua doente.
APOSTAS, INVESTIMENTOS E O BRASILEIRO MÉDIO
A escolha dos alvos da nova rodada de taxação também merece análise. As bets, que já pagam uma alíquota de 15% sobre a receita (GGR), agora pagarão ainda mais. Os títulos LCI e LCA, que eram uma das poucas opções de investimento isentas para o brasileiro médio, perderão esse benefício.
É curioso como o governo sempre encontra justificativas morais para seus aumentos de impostos. As bets são “vício”, os investimentos isentos são “privilégios”, as compras internacionais são “luxo”. Nunca é simplesmente uma decisão de aumentar a arrecadação às custas do contribuinte.
Enquanto isso, o tamanho da máquina pública continua crescendo. Em 2024, o governo federal contratou mais de 40 mil novos servidores, aumentando a folha de pagamento em bilhões de reais. Os gastos com viagens internacionais do presidente e sua comitiva já ultrapassaram R$ 50 milhões desde o início do mandato.
A PESQUISA QUE NINGUÉM QUER VER
Como especialista em marketing político, sei bem que pesquisas podem ser direcionadas e usadas conforme interesses específicos. Mas é difícil ignorar os números da recente pesquisa Quaest, que mostrou que 57% dos brasileiros desaprovam o governo Lula. Talvez essa avalanche de impostos tenha alguma relação com essa rejeição recorde.
A Quaest é um instituto respeitado e seus números são consistentes com outras pesquisas que mostram o crescente descontentamento da população com a economia. Quando 50% dos entrevistados dizem que o governo errou ao aumentar o IOF, é um sinal claro de que a paciência do contribuinte está se esgotando.
Mas, aparentemente, o Planalto prefere ignorar esses sinais e seguir com sua política de “arrecadar primeiro, perguntar depois”.
O QUE ESPERAR DAQUI PARA FRENTE?
Se o padrão dos últimos dois anos e meio se mantiver, podemos esperar pelo menos mais 10 aumentos ou criações de impostos até o fim do mandato de Lula. O ministro Haddad já sinalizou que outras medidas estão sendo estudadas para “aperfeiçoar o sistema tributário brasileiro” – eufemismo para “encontrar novas formas de tirar dinheiro do seu bolso”.
Entre as possibilidades já ventiladas estão:
• Imposto mínimo para super-ricos (quem ganha mais de R$ 50 mil por mês)
• Revisão da tabela do Imposto de Renda (que, apesar das promessas de campanha, continua defasada)
• Novas alíquotas para o Imposto sobre Herança
• Taxação de dividendos
É como se o governo tivesse um cardápio de impostos e estivesse experimentando um por um, para ver qual causa menos rejeição.
CONCLUSÃO: O CONTRIBUINTE COMO VACA LEITEIRA
De Portugal, observo esse espetáculo tributário com a distância geográfica que me permite ver o quadro completo, mas com o coração ainda pulsando no ritmo brasileiro, preocupado com os rumos de um país que parece eternamente condenado a tratar o contribuinte como uma vaca leiteira.
A troca do aumento do IOF pela taxação das bets e fim de isenções é apenas mais um capítulo dessa história. Uma história em que o governo sempre encontra novas formas de meter a mão no seu bolso, enquanto promete que, um dia, talvez, quem sabe, as contas públicas ficarão equilibradas.
Enquanto isso, o brasileiro segue fazendo o que sempre fez: trabalhando mais, pagando mais impostos e recebendo menos serviços em troca. É o Brasil de sempre, apenas com novos nomes para os mesmos impostos.
Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.
Aqui no blog, escreve com liberdade, opinião e um compromisso claro: provocar o leitor a pensar fora da caixa.
Fonte: blog do Papito do jornalista Tiago Helcias