O campo argumentativo da Segurança Pública brasileira vive tão florido de incompreensões, contradições e paixões que certas obviedades precisam ser permanentemente repetidas, repisadas e afirmadas – por mais tolo e vão que pareça fazê-lo. Neste pequeno texto o óbvio que queremos expor é o seguinte: qualquer policial pode estar insatisfeito com a estrutura organizacional a que está submetido e por isso critica-la, reivindicando mudanças e reformas.
É mesquinho e pouquíssimo democrático o entendimento de que “quem fez o concurso para uma corporação e aceitou o que estava estabelecido no edital não pode reclamar do que faz parte da corporação”. Segundo os defensores dessa paixão corporativista “se está insatisfeito, peça para sair”.
Ou seja: a corporação paira em uma atmosfera intocável, superior aos próprios objetivos para os quais foi criada. Tal qual um robô descontrolado, engole seus criadores – o próprio homem – e determina a eles o silêncio sobre suas engrenagens. A equação é invertida: o homem sobrevive para a corporação, e não a corporação é instrumento do homem para alcançar certos objetivos.
Reivindicar mudanças não significa praticar ilegalidade. Discordar de uma estrutura não significa quebrar o pacto legalmente assumido enquanto servidor público. Pensar e reivindicar soluções parece ser, aliás, mais genuinamente servir ao público do que fugir ao debate lúcido rumo a práticas e arquiteturas melhores.
É preciso reconhecer que há muita gente honesta agarrada ao sonho de que tudo o que foi construído até aqui seja suficiente para dar conta do presente e do futuro. Mas há também aqui e ali alguma desonestidade, que tem fome dos privilégios que sustentam e que perspectivamente querem sustentar. Aos primeiros, o debate fará muito bem. Aos segundos, nada os convencerá a não ser força e estratégia política.
Fonte: Abordagem Policial
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